Afinal, o que são Competências?
Você já deve ter percebido através de suas leituras e estudos que para ser bem sucedido profissionalmente você precisa desenvolver competências. Mas você já parou para se perguntar o que isso quer dizer de fato? Autores e publicações diferentes falam coisas distintas sobre o tema. As vezes até conflitantes. Para te ajudar a organizar essa questão em sua mente, escrevermos esse artigo. Ao final você terá uma visão muito mais clara sobre o que são e como desenvolver competências. Vamos lá?
De Onde Veio Isso?
A emergência do tema competências aconteceu quando as organizações constataram que o conhecimento é algo absolutamente necessário, mas devastadoramente insuficiente para se ter sucesso em qualquer atividade humana. Conhecer profundamente toda a teoria ligada à sua área de trabalho não vai lhe garantir sucesso. Independentemente do que signifique sucesso para você.
A Mc Ber & Co entendeu isso em trabalhos para o governo americano já no início da década de 70 e, desde então, diversos autores vêm esmiuçando a questão, alimentados por estudos como o de “Inteligências Múltiplas”, do Professor Hower Gardner, da Universidade de Harvard, e experimentos, como o quase folclórico Teste do Marshmallow realizado por Walter Mischel (University of Colorado, Harvard University, Stanford University e Columbia University), entre muitos outros.
Minha vivência como executivo e depois como professor e consultor – que juntas somam aproximadamente 30 anos – faz coro com esses estudos e me levam a acreditar com grande convicção que é perda de tempo depositar todas as esperanças (e esforços) sobre o conhecimento para chegar aonde quer que seja. Cansei de ver profissionais super qualificados do ponto de vista cognitivo que fizeram suas carreiras e/ou empresas naufragarem por falta de qualidades básicas de outras naturezas. Emocionais, por exemplo.
As Três Dimensões das Competências
A essência desse diagnóstico é compartilhada por praticamente todas as pessoas intelectualmente relevantes que conheço: “para ter sucesso não basta cultivar o conhecimento, apesar desse ingrediente ser fundamental”. É necessário lançar mão de um conjunto mais amplo de qualificações de naturezas diferentes para se buscar a excelência. De forma alguma o conhecimento é desimportante. Ele é muito importante. Apenas não é suficiente. E ele se fortalece muito quando integra as outras duas partes que sustenta o modelo de competências: as técnicas e as aptidões.
Por Que Dividir as Competências em Dimensões?
Alguém pode perguntar o motivo de se empreender tal divisão para sustentar a compreensão das competências. Por que pensar em técnicas, conhecimentos e aptidões e não simplesmente na competência de uma forma holística? Será mera elucubração acadêmica? Na verdade, existe um motivo muito prático para isso: a forma diferente de desenvolver cada uma dessas dimensões. A diferença na natureza dos componentes das competências faz com que elas precisem ser trabalhadas de formas particulares. Insisto que essa separação não tem motivação conceitual, mas fundamentalmente pragmática, já que a forma de desenvolver um pilar de uma competência depende de seu tipo. Vejamos…
A Dimensão Técnica das Competências
A dimensão técnica de uma competência é aprendida principalmente através de treinamentos de processos e da prática constante, frequentemente repetitiva e às vezes exaustiva. É o que chamamos também de “saber fazer”. Uma técnica é uma atividade que pode ser dividida em etapas compreensíveis e ensináveis de forma fragmentada. É possível, por exemplo, dividir uma apresentação em grandes etapas (abertura, desenvolvimento da ideia e fechamento) e seus elementos, separando os ingredientes que a empurram rumo à excelência, para ensinar a um aprendiz como melhorar sua performance em cada um desses diversos blocos e criar condições para que se busque a excelência na realização de apresentações. Logo a realização de uma apresentação tem um forte ingrediente técnico. Note que em momento algum dissemos que isso garante excelência. O domínio da técnica é condição necessária, mas não suficiente para a alta performance.
Se eu não domino as técnicas de uma apresentação soberba, terei limitações para realizá-la, ainda que eu conheça profundamente o assunto (conhecimento/saber) e tenha grande desenvoltura verbal (aptidão/ser). Por outro lado se eu dominar as técnicas, mas não tiver os conhecimentos e aptidões necessárias posso não executar uma apresentação brilhante. Só serei um apresentador diferenciado se sustentar meu domínio técnico com os conhecimentos e a aplicação das aptidões cabíveis.
A Dimensão Cognitiva das Competências
Vamos refletir então sobre as competências de natureza cognitiva (eis o conhecimento). Elas são aprendidas através da compreensão mental de modelos abstratos que subsidiam a técnica, além do domínio de relações amplas de causa e efeito. É o “saber” em sua configuração mais pura e está fortemente ligada com a visão teórica de um tema. Poderíamos mergulhar numa discussão filosófica profunda sobre o conhecimento, mas seria incompatível com nossa proposta. Filósofos discutem há séculos sobre o que é o conhecimento, e eu não pretendo me aventurar a resolver esse assunto nesse artigo. Então dou-me por satisfeito – e espero que você também – com essa explicação panorâmica. O importante é entender que para desenvolver essa dimensão das competências é necessário ler, assistir a aulas, estudar ou, em casos específicos, observar fenômenos recorrentes ou viver experiências ligadas ao tema para que haja compreensão conceitual.
Continuando com o caso de alguém que busca realizar uma apresentação excelente: se essa pessoa conhece, por exemplo, os princípios que regem a comunicação não verbal, terá sua possibilidade de realizar uma boa apresentação ampliada significativamente. A partir da capacidade de entender as relações recorrentes entre o que as pessoas estão sentindo e como elas manifestam esses sentimentos através do próprio corpo, um apresentador consegue calibrar continuamente seu discurso. Além do que, pode colocar em seus próprios gestos, mensagens que contribuem com a compreensão do conteúdo que busca transmitir.
As Aptidões como Dimensão das Competências
Por fim, os talentos – ou aptidões – têm uma forte relação com a essência de cada indivíduo e sua construção neurobiológica. Gostamos muito de chamá-las de “ser”, já que estão intimamente impregnadas na natureza de cada pessoa, não de forma imutável, mas com uma conformação bem menos flexível que as duas dimensões anteriores. Nossa experiência, lastreada na opinião de profundos conhecedores da área, nos diz que o caminho para o desenvolvimento nessa dimensão passa por identificar o repertório de sentimentos, pensamentos e comportamentos naturais de cada indivíduo, valorizá-los e aprender a articulá-los, aplicando-os de forma que estejam a serviço de um papel específico que se deseja cumprir. E depois, alavancá-lo adicionando conhecimentos e técnicas que os complementem. E em linha com as competências que se quer abraçar.
Se alguém (continuando em nosso exemplo da apresentação) se sente confortável ao falar em público, tem muito mais chance de entabular uma aula ou exposição envolvente. Melhor ainda se sente necessidade de fazer isso e gosta de estar em destaque, sendo notado e admirado. O que não significa que um bom apresentador é necessariamente extrovertido. Já vi quem consiga transformar sua suavidade e recato em elementos sedutores e envolventes em uma aula. O importante é reconhecer as próprias tendências de sentimento, pensamento e comportamento para canalizá-las, alavancando os resultados que se espera obter. Em alguns casos, talentos específicos são decisivos, mas na maioria das vezes o caminho é a identificação das próprias vocações e a sua correta aplicação na manifestação de uma competência.
Fechando a Compreensão de Competências
Então, fechando o exemplo que usamos ao longo de todo o artigo, ao somar as técnicas de apresentação, com os conhecimentos adequados (por exemplo, da linguagem não verbal) e algumas aptidões (como uma facilidade para transformar ideias em palavras) teremos uma grande chance de conseguir excelência na realização de uma apresentação.
Tendo entendido isso, podemos fechar nosso artigo com uma definição de competência, que para mim é a mais sucinta e esclarecedora de todas: “uma competência é uma característica ou conjunto de características que têm alta correlação com o desempenho excelente de uma função específica”. Como dissemos, geralmente, esse conjunto está composto por aptidões, conhecimentos e técnicas, mas podemos considerar que um desses pilares sejam, sozinhos, uma competência. Então, por exemplo, se houver uma alta correlação entre “carisma” e o desempenho de uma função, o “carisma” pode ser considerado uma competência.
Ativando a Excelência
Vale fechar dizendo, que dentro dessa perspectiva, uma competência é o potencial para se fazer algo com excelência. Esse algo se materializa na medida em que o profissional investe energia na dose certa para fazê-lo bem. Alguém pode dominar todas as técnicas, conhecimentos e ter aptidões para fazer uma boa apresentação, mas não se sentir nem motivado, nem comprometido, nem engajado para fazê-la e com isso realizá-la de forma deficiente ou não realizá-la. Quantas vezes já ouvimos a frase “ele tem tudo para ser um bom programador/contador/gerente, mas na verdade não quer.” Ou seja: ele tem a competência mas não a ativa, o que é assunto para um outro artigo.
Conclusão
Uma competência é uma característica ou um conjunto de características que guarda alta relação com o desempenho excelente de uma função específica. Tais características podem ser de natureza técnica (saber fazer/habilidades), cognitiva (saber/conhecimento) ou vocacionais (ser/aptidão). E a forma de desenvolver cada uma delas é diferente e portanto o processo de evolução deve ter características diferentes. Depois é importante ativá-las, incentivando a pessoa a querer colocá-la em prática.