Desenvolvendo para a Mediocridade
Imagine sua filha chegando em casa e lhe mostrando o boletim de notas. Duas lhe chamam a atenção: quatro em história e dez em matemática. Outra vez. É sempre assim. Vai muito bem nas exatas e mal em humanas. As notas baixas em história viraram regra. O mesmo para as altas em matemática. Agora, responda: nessa situação, quanto tempo sua conversa com ela giraria ao redor de história? E de matemática?
Se você é como a maioria esmagadora das pessoas, o foco todo ficaria nas notas baixas. E se você fosse contratar um professor particular: para que matéria seria? Você sabe a resposta. Tente imaginar a performance dela em história daqui a dez anos. Provavelmente média. Com esforço e algum apoio ela estaria apta para superar a média. Tudo bem até aí. E em matemática? Muito provavelmente média também. Afinal, ela não teria sido estimulada a desenvolver o que fluía naturalmente. Não teria sido reconhecida pelo seu talento e esforço na área; e a potencial excitação com o tema não evoluiria tanto quanto poderia. Média em história. Média em matemática. Idem em física, geografia e biologia.
E então cabe a pergunta: que nome damos a uma pessoa média em tudo? Acertou de novo. Esse é o resultado de focar nas fraquezas de uma pessoa: mediocridade. E o que isso tem a ver com a área de Recursos Humanos no mundo das organizações? Tudo, pois esse padrão que tem raízes neurobiológicas e tronco cultural se repete na forma como tentamos desenvolver pessoas nas empresas. Tente se lembrar das suas avaliações durante toda carreira. Com quantos planos de ação para melhorar pontos fracos você saiu dessas reuniões? Muitos, certo? E para alavancar seus pontos fortes. Raros, não é? Se é que houve algum.
Quantas vezes você ouviu algo do tipo: “Como você vai bem nas apresentações! Leva jeito. Se coloca bem. Tem um pensamento organizado. Vamos lhe pagar um treinamento de apresentações para você alavancar isso rumo à excelência”. Desculpe-me a ousadia, mas duvido. Eu sei essa resposta porque já fiz a milhares de executivos em centenas de treinamentos de liderança. E a menos que você seja uma exceção retumbante, deve ter vivido o mesmo.
Mas não são apenas minhas experiências que revelam essa situação. As pesquisas da Gallup confirmam isso de forma inequívoca. Ela perguntou em todo o mundo: O que você acha que vai ajudá-lo a melhorar mais, conhecer seus pontos fortes ou conhecer suas fraquezas? No país com maior foco em forças no globo, 59% das pessoas escolheram enfatizar as fraquezas. Já naquele mais inclinado às debilidades, 76% dos entrevistados responderam que queriam entender aquilo no que não eram bons. E qual o problema? Como vimos, esse caminho leva à mediocridade. O que leva à alta performance segundo décadas de estudo da Gallup é o foco naquilo que se tem de melhor.
Segundo essas pesquisas, por exemplo, uma pessoa que está focada nos pontos fortes tem seis vezes maior propensão a estar engajada no trabalho. E meu artigo anterior mostrou os impactos do engajamento nos resultados de uma organização. Mas não é só isso. Focar no lado bom também muda o nível de qualidade de vida dos colaboradores. Os dados apontam para o triplo de propensão a reportar um nível excelente nesse quesito. E os colaboradores das empresas verbalizam isso em outro estudo: apenas 21% deles concordam fortemente que sua performance é gerenciada de forma a ajudá-los a fazer um trabalho extraordinário.
Focar nos pontos fortes é substantivamente bom na medida em que impacta de forma positiva a vida das pessoas e funcionalmente superior pois leva a um maior engajamento e consequente produtividade. E por que esse não é o nosso padrão? Como disse acima, a nossa neurobiologia (construída numa época em que o foco nas fraquezas evitava a morte) e posterior incorporação na cultura nos levaram por esse caminho. E para destravar esse mindset, o primeiro passo é atenção e ação intencional. Estar alerta para a tendência ao negativo e agir de rumo ao positivo. Mãos à obra!